Projeto Empregadorismo conecta empresas interessadas em ampliar suas ações de diversidade
Histórias como a da professora de educação integral Yelitza Josefina Paredes, de 47 anos, que chegou ao Brasil em janeiro de 2018 como refugiada venezuelana, mostram a importância da inclusão nas empresas. A educadora, que deixou o seu país de origem em busca de melhores oportunidades, chegou a morar nas ruas de Boa Vista, Roraima, antes de ser acolhida pela Organização Internacional para as Migrações da ONU (OIM Brasil) e, posteriormente, receber uma oportunidade profissional na Associação Mawon. Hoje, Yelitza é uma das principais articuladoras comunitárias de refugiados venezuelanos no Brasil.
O talento em criar uma ampla rede de contatos – que atualmente conta com mais de 200 famílias de refugiados com origem na Venezuela – chamou a atenção da Associação, que enxergou em Yelitza o potencial de organizar as demandas dos imigrantes e, assim, conectá-los a empresas brasileiras.
“Com a instabilidade política na Venezuela, a população mais pobre é diretamente atingida. Com isso, muitos, como eu, deixam o país em busca de oportunidades. Sou professora, mas, quando cheguei ao Brasil, trabalhei como empregada doméstica em condições análogas à escravidão, até que fui acolhida pela ONU. Hoje, luto para que outros imigrantes não passem por isso, tenham condições dignas de sobrevivência e ajudem as empresas a diversificar e enriquecer seus quadros de funcionários”, afirmou a articuladora da Mawon.
A fala de Yelitza vai ao encontro do relatório Why diversity matters, divulgado pela McKinsey em 2019. O estudo aponta que empresas com estrangeiros em seu quadro de funcionários são 35% mais propensas a um maior retorno financeiro em relação a seus concorrentes na indústria nacional. A pesquisa revela ainda que a presença de um imigrante estimula a criação e amadurecimento da cultura de respeito, minimiza as chances de conflitos e de ocorrências dos casos de racismo entre os colaboradores.
“A inclusão de imigrantes no quadro de funcionários de uma empresa é um benefício tanto para os negócios, que se tornam mais diversos e ganham capital cultural, quanto para a sociedade, já que atua diretamente na diminuição da desigualdade social”, afirma Mélanie Montinard, co-fundadora da Mawon.
No dia 10 de dezembro, Dia Internacional dos Direitos Humanos, às 9h, a Associação Mawon irá realizar evento virtual para apoiar imigrantes a conseguirem acessar o mercado de trabalho no Brasil. O objetivo é fazer uma ponte entre empresas interessadas em ampliar a diversidade de seus funcionários e os 50 profissionais mapeados pela associação. Os profissionais são imigrantes de países vizinhos ao Brasil, sendo a maior parte venezuelanos. Empresas interessadas podem se inscrever no link: https://bit.ly/Evento_ESG_beneficios_da_contratacao_de_imigrantes
Juliana Kaiser, professora de diversidade na PUC-Rio e UFRJ, ativista do antirracismo e especialista em ESG, abre a programação do evento falando sobre como a contratação de imigrantes e refugiados pelas empresas aumenta os indicadores sociais, de diversidade e de governança por melhorar a condição de vida e tirar essas pessoas do estado de vulnerabilidade. “Muitas empresas não sabem como fazer e neste encontro será apresentada a metodologia que inclui, entre outros pontos, a regularização desses imigrantes do Brasil”, explica.
Segundo ela, o que mais impede as empresas de contratar imigrantes e refugiados é o total desconhecimento da pauta: por um lado, não sabem onde localizar essas pessoas. Só no Brasil existem mais de 274 mil venezuelanos, por exemplo, que saíram de seu país em função da crise humanitária. “Muitos são qualificados, estão prontos para o mercado, porém não são achados pelas empresas. A ONG Mawon promove esse match oferecendo capacitação profissional para esses imigrantes e refugiados e também regularizando o status migratório”, reforça Juliana Kaiser.
A ação faz parte da quarta edição do projeto Empregadorismo, que tem o apoio da Organização Internacional para as Migrações (OIM), a agência das Nações Unidas para as migrações, e da Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional (USAID).
Conheça a história de Yelitza
Antes de chegar ao Rio, a professora viveu “momentos de terror”, como ela mesma descreve, ao tentar a sorte no Brasil. Veio só com o filho mais velho, Moisés, na época com 18 anos. Quando chegou em Boa Vista, Roraima, as coisas foram muito diferentes do que pensava. O primo que a convidou a imigrar nunca apareceu. Sem ter para onde ir, Yelitza teve que morar nas ruas com o filho, passou fome e viveu sob condições de trabalho sub-humanas. Quando deixou seu país, acreditava que ficaria 90 dias fora. Nunca mais voltou. E demorou longos 17 meses para ter a família completa ao seu lado. O marido também conseguiu deixar a Venezuela mais tarde com seus outros filhos: Maria Fernanda, Juan e Maria Vitória. O reencontro aconteceu em março de 2019.
Para entrar no Brasil pela fronteira de Pacaraima, município no Norte de Roraima, Yelitza esperou autorização por três dias. “Tinham milhares de venezuelanos esperando permissão de entrada”, conta. Sem ter para onde ir, após o sumiço do sobrinho, ela e o filho passaram a morar nas ruas. “A língua foi o primeiro desespero. No primeiro dia, dormimos na Praça das Águas de Boa Vista. Lá, os bancos estavam proibidos de serem usados para dormir. Buscamos um lugar no chão junto a outros venezuelanos.”, relembra com muito pesar.
Foram três meses de agonia até conseguir um abrigo junto à Organização Internacional para as Migrações da ONU (OIM Brasil). Em julho de 2018, fez parte da primeira turma de 50 imigrantes trazidos pela ONU de Boa Vista para o Rio de Janeiro. Por três meses, permaneceu em abrigo no Itanhangá, Zona Oeste da cidade, financiado pela OIM Brasil.
Depois de sair do abrigo, continuou a morar perto de lá e virou uma referência para os venezuelanos que chegam ao Rio. Formou uma rede e começou a ajudar famílias de refugiados com informações sobre status migratório e orientações do dia a dia, desde como pagar aluguel até referências de mercado e farmácia por perto.
Passou a ser procurada não só na comunidade do Morro Branco, onde vive, mas em toda a região. São cerca de 200 famílias espalhadas por Morro Branco, Tijuquinha, Muzema, Gardênia Azul e Freguesia, conta ela. Durante a pandemia, ajudou na distribuição de cestas básicas. Foi essa grande capacidade de agregar e resolver problemas que a levaram a fazer parte da Associação Mawon, como articuladora.
Recentemente, decidiu comandar atividades de reforço escolar. Como, para Yelitza, uma coisa leva a outra, das aulas de reforço surgiu um novo projeto, chamado “Resgatando raízes”. Ideia que teve a partir do relato das crianças sobre saudades da terra natal. No projeto, ela resgata a identidade cultural venezuelana, com músicas, datas históricas, culinária, artesanato, tradição e ancestralidade indígena, dança popular etc. “Eu sou professora e eu vou sempre professora”, afirma orgulhosa.
Sobre a Associação Mawon
A Associação Mawon é um negócio social com foco na capacitação e geração de renda da população migrante no Brasil. A regularização da situação dos migrantes, com a obtenção da documentação legal, também é realizada pela Mawon.
O projeto Empregadorismo tem foco no desenvolvimento pessoal e na melhora da autoestima de imigrantes no Brasil. Ações como o auxílio na elaboração de currículos e o contato com empresas auxiliam os participantes a entrarem no mercado de trabalho.
Conheça o site da Associação Mawon: https://www.mawon.org
Sobre o projeto Empregadorismo: https://www.mawon.org/empregadorismo
Imagem: UN News – the United Nations.
atualizado em 09/12/2021 - 09:58